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O erro que faz pagar duas vezes pelo mesmo trabalho

Duas pessoas planificam uma obra, tirando medidas com tablet e tabelas em zona de construção com ferramentas.

Num orçamento apertado, é fácil achar que o problema nos trabalhos de construção é “o preço dos materiais” ou “a mão de obra ficou mais cara”. Muitas vezes, o rombo vem de outra origem: custos de retrabalho que passam despercebidos até aparecerem em faturas duplicadas, prazos a estourar e equipas a refazer o que já estava “feito”. O pior é que este erro parece pequeno no início, mas cresce como uma infiltração: silencioso, caro e inevitável se ninguém o travar.

O padrão repete-se em obras pequenas e grandes. Uma decisão apressada, uma medição mal confirmada, uma indicação dada por telefone “só para desenrascar”, e de repente há paredes abertas, revestimentos removidos e horas a somar no fim do mês.

O erro que desencadeia o pagamento a dobrar

Há uma falha que está por trás de grande parte do retrabalho: avançar para a execução sem um “ponto de validação” claro - isto é, sem confirmar medidas, compatibilizações e aprovação do cliente antes de fechar o que depois não dá para ver.

Em termos práticos, acontece quando se passa diretamente para “fazer” (assentar, fechar, pintar, instalar) sem garantir que tudo o que está por trás está certo: prumadas, níveis, cotas, passagens, inclinações, posições de tomadas, pontos de água e ventilação.

O retrabalho raramente vem de “um erro enorme”. Quase sempre nasce de um detalhe não verificado que, depois de fechado, custa o dobro a corrigir.

Como o retrabalho se instala na obra (sem alarme)

O retrabalho tem um lado ingrato: muitas vezes parece uma pequena correção. Só que as pequenas correções raramente vêm sozinhas.

Um exemplo típico: a base de duche fica 2 cm fora do alinhamento previsto. “Dá para compor no revestimento.” Mais tarde percebe-se que a queda não ficou certa, a água empoça, e é preciso levantar peças, refazer impermeabilização e voltar a assentar.

Outro exemplo: a cozinha avança sem desenho final validado. Quando os módulos chegam, falta uma tomada onde devia estar, ou a saída de exaustão ficou desalinhada. O que era “só abrir um roço” torna-se pó, pintura nova e mais dias de obra.

Sinais de que está a entrar na zona de risco

Há alguns indícios práticos que costumam aparecer antes do prejuízo se tornar grande:

  • decisões tomadas “no local” sem registo (mensagem, desenho, foto anotada);
  • medições feitas uma vez e nunca reconfirmadas antes de encomendar;
  • equipas diferentes a trabalhar sem uma sequência clara (um fecha, outro precisa de passar);
  • alterações do cliente a meio, aceites sem reorçamentar e sem rever impactos.

O que custa mesmo: não é só “refazer”

Os custos de retrabalho não são apenas o preço de repetir a tarefa. Em obra, o que pesa é o efeito dominó: desmontar, proteger, limpar, voltar a preparar superfícies, gerir resíduos e reprogramar equipas.

E há um custo invisível que costuma ser ignorado: o tempo de coordenação. Telefonemas, deslocações extra, discussões sobre “quem errou”, espera por novo material, e dias em que a obra parece andar… mas não avança.

Um mapa simples do “pagar duas vezes”

Situação 1.ª vez 2.ª vez (o que aparece)
Assentar revestimento sem confirmar níveis Mão de obra + material Demolição + resíduos + novo material + nova mão de obra
Fechar paredes sem validar passagens Execução rápida Abrir + reparar + pintar + atrasos noutras frentes

Porque é tão comum em trabalhos de construção

Há três razões que se repetem em quase todas as obras:

  1. Pressa para “mostrar progresso”. Fechar paredes e avançar com acabamentos dá sensação de avanço, mas reduz margem para corrigir.
  2. Informação a circular de forma informal. “O eletricista disse”, “o canalizador costuma fazer assim”, “o cliente quer mais ou menos aqui”.
  3. Falta de um momento de aprovação. Sem um “ok” formal (mesmo que simples), tudo fica sujeito a memória e interpretações.

Quando isto acontece, o retrabalho não é azar. É consequência.

Como evitar o erro com um processo curto (e realista)

Não é preciso burocracia pesada nem pastas intermináveis. O objetivo é criar 2 ou 3 travões de segurança antes de fases irreversíveis.

1) Criar um “check” antes de fechar e antes de encomendar

Dois momentos críticos:

  • Antes de fechar (pladur, reboco final, betonilha, impermeabilização tapada)
  • Antes de encomendar (cozinhas, caixilharias, resguardos, cerâmicos, bancadas)

Nesses pontos, vale mais 15 minutos a confirmar do que 2 dias a refazer.

2) Registar decisões com prova simples

Uma foto com marcação, uma nota numa mensagem, um esquema rápido no telemóvel. O importante é que fique claro o quê, onde e com que medida.

  • Foto do local + fita métrica visível
  • Mensagem: “Tomada a 110 cm do chão acabado, centrada no móvel”
  • Desenho rápido com duas cotas principais

3) Separar “alteração” de “correção”

Quando o cliente muda de ideias, isso não é correção - é alteração. E alteração mexe em prazos e custos, mesmo que pareça pequena.

Se não houver este filtro, a obra transforma-se num conjunto de favores… até ao dia em que alguém tem de pagar a conta.

Se já aconteceu: como travar o retrabalho antes de crescer

Quando surge um erro em obra, a tendência é “desenrascar” para não parar. Às vezes dá. Muitas vezes só adia.

Um plano curto ajuda a evitar repetir o mesmo ciclo:

  • parar 30 minutos para identificar a causa (medida? desenho? comunicação? sequência?);
  • decidir a correção com critério (o que fica comprometido se “se disfarçar”?);
  • registar a decisão e atualizar o que falta (desenho, lista de materiais, sequência de equipas);
  • reprogramar a frente seguinte para não criar novo conflito.

O objetivo não é procurar culpados. É impedir o terceiro pagamento.

FAQ:

  1. O retrabalho é sempre culpa do empreiteiro? Não. Pode vir de alterações do cliente, falta de projeto detalhado, medições inconsistentes ou incompatibilidades entre especialidades. O ponto crucial é haver validação e registo antes de fases irreversíveis.
  2. Vale a pena fazer “pontos de validação” em obras pequenas? Sim, especialmente em cozinhas, casas de banho e caixilharias. São áreas onde um erro de centímetros costuma gerar demolição, substituições e atrasos.
  3. Como controlo custos de retrabalho sem transformar a obra em burocracia? Use checklists curtas (antes de fechar e antes de encomendar) e registo simples por fotos/mensagens com medidas. É leve, rápido e evita discussões mais tarde.

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