Tinha um projeto simples na cabeça: “vou contratar várias profissões, cada uma faz a sua parte, e isto avança”. Na prática, o que aparece quase sempre é a coordenação de equipa a falhar no sítio mais caro: nos detalhes entre tarefas. E é aí que o orçamento escorre, o prazo derrapa e a culpa fica a circular sem parar.
Vê-se muito em obras, rebranding, lançamento de sites, eventos, até em processos internos de empresas. O eletricista espera pelo pladur, o designer espera pelo texto, o programador espera pelo design “final”, e toda a gente trabalha… mas o projeto não anda.
Quando “cada um trata do seu” cria um buraco no meio
O problema não é falta de talento. É o espaço entre talentos.
Quando contrata profissionais separados, compra execuções. Mas raramente compra responsabilidade pelo encaixe. E o encaixe é onde vivem as decisões invisíveis: medidas, prioridades, sequência, dependências, versões, aprovações.
No papel, parece eficiente: vários especialistas, cada um no seu quadrado. No terreno, começam as micro-perguntas que ninguém “tem” de responder:
- “Isto vem antes ou depois?”
- “Quem valida?”
- “Posso avançar com uma suposição?”
- “Se eu mudar aqui, quem é impactado?”
Se não existir alguém a segurar o fio, o projeto transforma-se num conjunto de tarefas concluídas… que não encaixam.
Contratar por peças funciona bem quando o trabalho é modular. Falha quando as peças precisam de afinação em conjunto.
O custo oculto: retrabalho, esperas e decisões atrasadas
O dinheiro raramente se perde na tarefa principal. Perde-se no retrabalho.
Um exemplo típico numa renovação: o carpinteiro monta, depois percebe-se que as tomadas ficam tapadas, e volta-se atrás. Num site: o copy muda depois do design aprovado, o layout rebenta, o programador refaz, e a SEO fica para “fase 2” que nunca chega.
O padrão repete-se porque, sem coordenação de equipa, cada profissional otimiza o seu output, não o resultado final. Isso cria três fontes de custo:
- Espera (ninguém avança porque “falta X”)
- Conflito de versões (ficheiros, medidas, briefings diferentes)
- Retrabalho (refazer para compatibilizar decisões tomadas tarde)
E quanto mais “separada” está a contratação, mais a sua agenda vira o buffer. Você torna-se o gestor de projeto por defeito, mesmo sem querer.
Sinais de que está a acontecer (mesmo que pareça tudo “sob controlo”)
Há um momento em que o projeto fica com um ruído específico. Não é drama; é fricção diária.
Se reconhecer dois ou mais destes sinais, já está a pagar o imposto da falta de coordenação:
- As conversas são 80% sobre “pontos de situação” e 20% sobre decisões.
- Toda a gente pede “o mais atualizado”, mas ninguém sabe qual é.
- Surgem frases como “eu faço, mas preciso que alguém me diga…”.
- O prazo mexe sempre por 2–3 dias, várias vezes seguidas.
- As pessoas entregam, mas entregam “para a parte delas”, não “para o todo”.
O efeito psicológico também conta: começa a evitar decisões porque cada decisão parece abrir mais trabalho.
Porque é que isto acontece: ninguém é dono das interfaces
Há tarefas. E há interfaces.
Interface é o sítio onde um trabalho toca no outro: medidas entre especialidades, handoff de ficheiros, dependências, responsabilidades, critérios de “pronto”. Quando contrata profissionais separados, quase nunca define quem é dono das interfaces.
O resultado é previsível: cada um protege o seu perímetro. Se algo corre mal, o problema “vem de fora”.
Uma forma simples de ver o que falta é esta:
| Situação | O que costuma acontecer | O que evita o problema |
|---|---|---|
| Alteração a meio | Impacto não mapeado | Dono da decisão + checklist de impactos |
| Entrega “quase pronta” | Falta compatibilização | Definição clara de “pronto” |
| Urgências constantes | Tudo é dependência | Sequência e bloqueios visíveis |
A solução prática: comprar ligação, não só execução
Não precisa de “mais reuniões”. Precisa de um sistema mínimo que faça a ligação entre partes.
Na prática, há três caminhos que funcionam:
Um coordenador único (interno ou externo)
Alguém que decide sequência, valida encaixes e resolve bloqueios. Não tem de ser o melhor técnico; tem de ser o melhor a fechar decisões.Um responsável por disciplina + um “dono do todo”
Mantém especialização, mas garante que existe uma pessoa a olhar para o resultado final (prazos, integração, riscos).Contratar uma equipa que já trabalha junta
Muitas vezes parece mais caro no início, mas sai mais barato quando conta retrabalho, atrasos e desgaste.
Se escolher manter profissionais separados, imponha um “kit de coordenação” simples:
- Um documento de decisão (quem decide o quê e em quanto tempo).
- Uma lista de dependências (o que bloqueia o quê).
- Uma pasta única com versões (e regra de nomes).
- Um check-in curto semanal com decisões fechadas, não só status.
O mini-contrato de 7 dias para estancar a confusão
Se o seu projeto já está em andamento e não quer “reorganizar tudo”, faça um teste de uma semana. Funciona como um reset sem drama.
- Dia 1: lista de entregáveis e ordem real (não a ideal).
- Dia 2: definir “pronto” para 3 entregas críticas (ex.: inclui revisão, inclui medidas finais, inclui testes).
- Dia 3: nomear um ponto de contacto único por profissional (uma pessoa, não “a empresa”).
- Dia 4: fechar duas decisões pendentes que estão a atrasar tudo.
- Dia 7: rever o que desbloqueou e o que ainda se repete (e eliminar uma causa, não dez sintomas).
O objetivo não é controlar pessoas. É tornar o trabalho compatível sem depender de adivinhações.
O que muda quando a coordenação existe (e o seu papel fica mais leve)
Quando a coordenação de equipa está no sítio, o projeto deixa de viver de “empurrões”. As pessoas passam a trabalhar com critérios comuns e com menos medo de refazer. E você deixa de ser o centro de triagem para dúvidas técnicas que não devia ter de responder.
A diferença sente-se numa coisa pequena: as mensagens deixam de ser “falta isto” e passam a ser “preciso de decidir entre A e B, com este impacto”. É aí que o projeto recupera velocidade - não porque trabalha mais, mas porque trabalha na mesma direção.
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