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Se ninguém mede progresso, os problemas crescem

Homem com colete laranja e capacete fala com mulher em obra enquanto outro tira foto com telemóvel.

Eram 7:12 da manhã quando o encarregado abriu o grupo de WhatsApp e atirou a frase do costume: “Está tudo em dia.” Numa obra real, essa frase vale pouco se não existir monitorização da construção a sério, com acompanhamento de progresso que mostre o que foi feito, por quem, quando e com que qualidade. É relevante porque, sem métricas simples e regulares, os atrasos e os erros não aparecem como um alarme - aparecem como uma surpresa cara no fim do mês.

Ao meio-dia, já havia três versões diferentes da mesma história: o betão “estava marcado”, o material “já tinha chegado” e a equipa “só estava à espera”. Às 18:00, o dono de obra perguntava pelo cronograma e alguém respondia com uma foto tremida, tirada de longe, para provar “movimento”. E é assim que os problemas crescem: no espaço entre o que achamos que está a acontecer e o que, de facto, está a acontecer.

O mito do “está quase”: quando ninguém mede, tudo parece andar

Numa obra, o “quase” é um buraco negro. “Quase fechado”, “quase pronto para pintura”, “quase pronto para receber o pavimento” - e, no entanto, basta um detalhe por fechar (um vão mal preparado, uma pendente errada, uma passagem sem manga) para travar a fase seguinte.

O mais traiçoeiro é que, sem medição, o cérebro preenche os espaços. Vemos placas colocadas e assumimos que a parede está alinhada. Vemos uma palete de material e assumimos que a aplicação já arrancou. O ruído da obra dá uma sensação de avanço, mesmo quando a sequência está partida.

Há também um fenómeno silencioso: as pequenas decisões “no terreno” que não ficam registadas. Hoje muda-se um pormenor “só para desenrascar”, amanhã aquilo vira padrão, e quando alguém finalmente repara, já está embebido em argamassa e em horas de mão de obra.

O que a monitorização da construção deve captar (para ser útil, não “bonita”)

O objetivo não é colecionar fotografias. É criar evidência que permita decidir cedo: reforçar equipa, ajustar encomendas, corrigir execução antes de tapar, ou renegociar prazos com base em factos.

Um sistema mínimo, mas eficaz, tende a cobrir quatro camadas:

  • Progresso físico: percentagem executada por tarefa (não por “zona vaga”), com critérios claros de “feito”.
  • Qualidade e conformidade: pontos de inspeção antes de fechar (armaduras, impermeabilizações, instalações).
  • Planeamento real vs. planeado: o que era suposto acontecer esta semana e o que aconteceu.
  • Restrições: o que está a bloquear (materiais, decisões, acessos, subempreiteiros, clima).

Sem isto, o acompanhamento de progresso vira conversa. E conversa não segura prazos.

Um exemplo curto (e demasiado comum) de como o atraso se multiplica

Imagina uma remodelação com três frentes: instalações, pladur e acabamentos. Numa quinta-feira, alguém diz que “as instalações já estão”. Ninguém valida pontos críticos: teste de estanquidade, fotos das passagens, cotas, localização de caixas. Na sexta-feira, fecha-se pladur para “ganhar tempo”.

Duas semanas depois, aparece a infiltração ou a tomada fora de sítio. Para corrigir, abre-se parede, perde-se pintura, perde-se tempo, volta a chamar equipas que já estavam noutra obra. O problema original era pequeno. O custo final é grande porque cresceu escondido.

A regra é simples: o que não é verificado antes de fechar, fica mais caro depois.

Como medir sem transformar a obra num escritório

A melhor monitorização é regular e leve. Tem ritmo, não tem drama. Se depender de “quando houver tempo”, não acontece.

Um modelo prático (muitas equipas usam algo parecido, com mais ou menos tecnologia):

  1. Reunião curta semanal (20–30 min) no local, com lista de tarefas da semana e bloqueios.
  2. Checklist por fase com pontos de paragem (ex.: antes de betonagem, antes de fechar pladur, antes de impermeabilizar).
  3. Registo fotográfico com contexto: sempre com data, local, e legenda (“WC Piso 1 - tubagem quente/fria testada”).
  4. Uma métrica simples por equipa: tarefas concluídas vs. planeadas, e motivo quando falha (não para culpar, para ajustar).
  5. Alterações registadas: qualquer desvio ao projeto vira nota, mesmo que seja “pequeno”.

Vamos ser honestos: ninguém mantém isto perfeito todos os dias. Mas manter “o suficiente” todas as semanas muda tudo, porque reduz a zona cinzenta onde os problemas se alimentam.

“A obra não atrasa de um dia para o outro. Atrasa-se em parcelas pequenas que ninguém quis ver.”
- frase que se ouve muito tarde, e vezes demais

Sinais de que o teu acompanhamento de progresso está a falhar

Nem sempre é falta de vontade. Às vezes é falta de método. Se reconheces dois ou três destes sinais, vale a pena corrigir já:

  • As datas mudam, mas não existe registo do porquê.
  • As fotos aparecem, mas não provam conclusão (sem detalhe, sem localização, sem sequência).
  • O “estado” depende da pessoa que responde (cada um tem a sua verdade).
  • Descobrem-se problemas quando já está tapado.
  • O planeamento é um PDF bonito, mas ninguém o usa para decidir a semana.

A parte dura é aceitar que “estar em obra” não é o mesmo que “ter controlo”. A parte boa é que medir não precisa de ser pesado - precisa de ser consistente.

Ponto-chave O que fazer Benefício
Progresso verificável Definir “feito” por tarefa e validar no local Menos “quases”, mais previsibilidade
Pontos de paragem Checklists antes de fechar fases Menos retrabalho e custos surpresa
Registo de bloqueios Anotar o que impede avançar Decisões mais rápidas e menos espera

FAQ:

  • Como começo a monitorização da construção sem software? Com uma checklist por fase, uma reunião semanal curta e um registo fotográfico com data/local/legenda. Uma folha partilhada já resolve 80%.
  • O que devo medir no acompanhamento de progresso: percentagens ou tarefas? Tarefas com critérios de conclusão. Percentagens sem definição de “feito” viram discussão.
  • Quem deve registar: o encarregado, o fiscal, ou o dono de obra? Idealmente quem está no terreno (encarregado) com validação do fiscal. Se não houver fiscal, o dono de obra deve exigir evidência antes de fechar fases.
  • Quantas fotos são “suficientes”? Poucas, mas úteis: detalhe + contexto, e sempre antes/depois em pontos críticos. Melhor 10 fotos bem legendadas do que 80 sem sentido.
  • Como evito que isto vire caça ao erro? Foca-te em bloqueios, critérios e próximos passos. O objetivo é decidir cedo, não apontar dedos tarde.

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