O problema raramente começa no pó e no barulho. Começa no planeamento de renovação - ou na falta dele - quando os erros de pré-construção passam despercebidos e só aparecem como “surpresas” no orçamento, no calendário e na convivência em casa. Antes da primeira demolição, é aqui que se decide se a obra vai correr com controlo ou à base de remendos.
Há uma ilusão comum: “a demolição é o primeiro passo”. Na prática, a demolição é apenas o primeiro momento visível. O resto - decisões, medições, licenças, encomendas, compatibilizações - já devia estar alinhado.
Porque é que os erros acontecem tão cedo (e custam tão caro)
Na pré-construção, quase tudo é reversível no papel e muito pouco é reversível na obra. Uma parede pode sair “só um pouco” mais à frente, uma tomada “fica para depois”, uma janela “logo se vê”. E, de repente, a cozinha não fecha com a porta, o exaustor não tem saída, e o empreiteiro começa a pedir aditamentos.
Um pequeno erro de decisão antes da obra vira um grande erro de execução durante a obra.
O outro gatilho é a pressa. Quando a data de começar manda mais do que a clareza do plano, a obra avança sem respostas básicas: o que fica, o que sai, que materiais entram, quando chegam, quem faz o quê.
Os top erros cometidos antes mesmo da primeira demolição
1) Começar por escolher acabamentos antes de fechar o layout
Azulejos e pavimentos são o “lado Instagram” da renovação, mas o desenho manda em tudo: portas, passagens, medidas de móveis, pontos de água, ventilação, iluminação. Sem layout fechado, cada escolha bonita pode tornar-se uma escolha impossível.
Sinal típico: compras feitas “porque estavam em promoção” e depois a obra adapta-se à compra, em vez da compra servir o projecto.
2) Medir por alto (ou confiar em plantas antigas)
“Parece ter 3 metros.” Parece. E é aí que nascem armários que não cabem, divisórias que apertam circulações, bases de duche fora de esquadria e janelas que colidem com estores.
O mínimo saudável antes de avançar é confirmar no local: comprimentos, alturas, prumos e esquadrias, e onde passam infraestruturas.
3) Não decidir o que é “intocável” e o que é “negociável”
Sem prioridades, tudo vira discussão no meio da poeira. Se não está definido o que é essencial (ex.: manter o soalho, preservar um tecto, salvar uma porta original), o impulso da obra é demolir, nivelar e “deixar novo”.
E depois chega o arrependimento, normalmente quando já não dá para voltar atrás sem pagar duas vezes.
4) Ignorar tempos de entrega e dependências
Há materiais com prazos curtos e outros com prazos longos: caixilharia, cozinhas, pedras, equipamentos específicos. O erro não é só “demora”. É o efeito dominó: sem o lava-loiça não se fura o tampo; sem o tampo não se fecha a cozinha; sem a cozinha a casa não é habitável.
Uma regra simples ajuda: se algo bloqueia várias frentes, tem de ser decidido e encomendado cedo.
5) Não validar o estado real das infraestruturas
Renovar sem olhar para electricidade, canalização, esgotos e ventilação é como pintar um carro com o motor a falhar. Pode ficar bonito por fora e problemático por dentro.
Os sinais que pedem atenção antes da demolição: - disjuntor que dispara com cargas normais - humidades recorrentes e cheiros a esgoto - pouca pressão de água ou ruídos na tubagem - falta de ventilação em WC/cozinha (mofo, condensação)
6) Orçamento sem margem e sem mapa de inclusões
“Quanto fica?” é uma pergunta legítima, mas sem um mapa de inclusões vira uma resposta elástica. O erro clássico é comparar números sem comparar o que está dentro: demolições, remoção de entulho, reparações de base, primários, impermeabilizações, testes, limpeza final.
Um orçamento baixo sem inclusões claras é, muitas vezes, um orçamento que vai crescer.
7) Assumir que licenças e aprovações “logo se trata”
Condomínio, câmara, regras de ruído, alterações de fachada, mudanças de caixilharia, intervenções estruturais - tudo isto pode travar a obra ou forçar recuos caros. Mesmo quando não há licença, pode haver comunicação, horários e regras internas.
Se há dúvidas, resolve-se antes, não com a casa aberta e a equipa à espera.
8) Não definir quem decide (e em quanto tempo)
Obras morrem em micro-decisões: altura de tomadas, posição de apliques, sentido de abertura de portas, cor de juntas. Sem uma pessoa responsável por decisões e um prazo de resposta, a equipa para - ou avança “como sempre faz”. E depois surgem os “não era nada disto”.
Uma boa prática é simples: decidir um canal único (grupo/ email) e um prazo máximo de resposta para dúvidas em obra.
Um mini “ritual” de pré-obra que evita 80% dos dissabores
Sem drama e sem burocracia: é um processo curto, repetível, e dá uma sensação de controlo semelhante a um checklist técnico.
- Feche o layout (medidas confirmadas no local) e congele alterações grandes.
- Faça uma lista de decisões por divisão: electricidade, águas, iluminação, ventilação, acabamentos.
- Crie um mapa de inclusões do orçamento (o que está e o que não está).
- Valide prazos de entrega dos itens que bloqueiam a obra.
- Combine regras do prédio e vizinhança (ruído, elevador, protecções, horários).
- Defina um “dono da decisão” e como as aprovações vão ser dadas.
Sinais de alerta: quando está prestes a começar cedo demais
Se reconhecer dois ou três pontos destes, pare um dia e acerte o plano. Esse dia costuma poupar semanas.
| Sinal | O que costuma acontecer |
|---|---|
| “Logo vemos em obra” em decisões-chave | Aditamentos e atrasos por retrabalho |
| Materiais comprados sem medidas finais | Trocas, desperdício, adaptações feias |
| Orçamento sem lista de inclusões | Discussões e custos “inesperados” |
FAQ:
- É possível começar a demolição só para “adiantar serviço”? É possível, mas arriscado. Sem layout fechado, plano de infraestruturas e encomendas críticas lançadas, a demolição costuma criar pressão para decidir mal e rápido.
- Qual é o erro de pré-construção mais comum? Orçamento sem inclusões claras. Não é só o valor: é a falta de definição do que está incluído, que abre espaço para custos extra.
- Quanto tempo devo reservar para planeamento de renovação? Depende da complexidade, mas reserve pelo menos tempo para: medições no local, desenho/decisões por divisão, validação de infraestruturas e prazos de entrega. Se isso não está feito, começar a obra raramente “ganha tempo”.
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